Material de suporte para a participação de crianças vítimas e testemunhas em audiências judiciais

O sítio eletrônico do Office for Victims of Crime, do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, apresenta material de apoio para a abordagem de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de crime que estejam em vias de passar por procedimentos judiciais. Esse material também é voltado para profissionais e familiares.

Independentemente da avaliação específica sobre o conteúdo do material, sua existência sugere o quanto se deve avançar nas práticas e pesquisas sobre o tema, em particular no Brasil.

A amplitude de questões relacionadas expressam-se de modo agudo nas discussões relativas ao depoimento especial, mas não somente ali. Revitimização, vitimização secundária, testemunho, violência são alguns dos conceitos que são mobilizados na abordagem de crianças e adolescentes em qualquer procedimento no qual estejam participando. Nosso posicionamento frente a eles desenha as vias pelas quais a experiência do atendimento é apreendida, desdobrando-se nos modos pelos quais o sistema judicial, a polícia e os demais segmentos acolhem aqueles personagens. Os efeitos das práticas institucionais com crianças e adolescentes vítimas e testemunhas permanece campo de investigações e disputas que devem ser retomadas sistematicamente.

Não é por acaso que Tilman Fürniss enfatiza a importância da articulação entre os diferentes serviços que atendem crianças vítimas de violência sexual. Ele argumenta a favor de um tempo oportuno para as intervenções, que parte de algumas premissas: a separação entre o que é da esfera da saúde, da psicologia e o que é policial, judicial; o esclarecimento sobre como lidar com a crise vivenciada por profissionais diante de caso de possível violência sexual contra criança, quando se tenderá a querer resolver tudo rapidamente, sem atentar para a importância de agir com método; o reconhecimento da pessoa de confiança, aquela para quem a criança terá em primeiro lugar mencionado algo da suposta situação vivenciada. Desse modo, o sucesso, segundo Fürniss, será decorrente de dois fatores: grau de conhecimento dos fatos e grau de coordenação entre as diferentes intervenções necessárias.

Deve ser sublinhado que o depoimento judicial de crianças e adolescentes conta com ampla visibilidade no exterior, sendo objeto de matérias jornalísticas recorrentes. Essa visibilidade advém do aumento de participações de crianças em audiências e da constatação de que há falhas graves nos procedimentos adotados. Parte dessas falhas foi resumida pelo jornal britânico The Guardian:

as crianças enfrentam problemas significativos quando testemunham em juízo. O problema-chave . . . é a falta de apoio consistente, de efetivo gerenciamento das fases de pré-julgamento e julgamento propriamente dito, bem como do controle de questionamentos desleais.

A Inglaterra é apontada por Fürniss como referência positiva em práticas relacionadas à intervenção em casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. Diferentes autores apontam para o mesmo país, indicando que as reformas realizadas ou propostas ali devem ser cuidadosamente estudadas. Essas práticas e diretrizes estão consolidadas no Achieving Best Evidence in Criminal Proceedings: Guidance on Interviewing Victims and Witnesses, and Guidance on Using Special Measures.

Achieving Best Evidence apresenta definições e orientações e é divulgado pelo The Crown Prosecution Service, principal órgão de acusação em processos criminais na Inglaterra e no País de Gales. Ele é assinado por representantes do Ministério da Justiça e outros ligados à assistência social e à infância. O documento enfatiza a importância do planejamento e da preparação da criança e do adolescente para as entrevistas no espaço judicial, o que pode ocorrer imediatamente antes da audiência ou durar tempo indeterminado; o cuidado em definir conceitos e noções; o estabelecimento de um sistema de avaliação consistente; a responsabilidade dos entrevistadores quanto a garantir que o depoente esteja participando livremente do procedimento; o uso da pessoa de apoio, denominada court witness supporter; e a eventual utilização do victim impact statement, denominado victim personal statement.

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Sequestro e tortura de crianças: disputas memoriais

Como crianças foram tratadas durante a ditadura brasileira?

Eduardo Reina aponta em seu livro que segundo os registros oficiais há apenas uma criança sequestrada por motivos políticos durante o regime civil-militar: Lia Cecília da Silva Martins.

Ele aponta que esse quadro destoa do que foi corrente nos demais países sul-americanos que passaram pela experiência da ditadura. Contudo, diferentemente do discurso oficial, Reina levanta 19 casos de crianças sequestradas durante a ditadura civil-militar no Brasil que acabaram adotadas de forma irregular. Parte desse grupo ainda estaria a procura de sua família de origem. Experiência que se traduz no título do livro: cativeiro sem fim.

Ao serem entregues a família vinculadas à repressão ou a instituições onde depois foram adotadas de forma ilegal, perderam sua história, sua memória e, principalmente, sua identidade. [25]

Reina, E. (2019). Cativeiro sem fim: As histórias dos bebês, crianças e adolescentes sequestrados pela ditadura militar no Brasil. São Paulo: Alameda.

Mario Magalhães em sua biografia de Marighella aponta experiências de violência extrema que alcançaram filhos de engajados na luta armada.

[…] Na Oban, um murro quebrou os dentes frontais de Ilda, que provou do cardápio de pau de arara e barbárie. Os sádicos inquiriram sobre o paradeiro do marido morto. Para desespero da mãe, prometeram surrar as crianças, até o bebê, e doá-las. [525]

[…] Uma das maldades impostas a Ilda na Oban era anunciar Isabel, cuja amamentação fora interrompida, e em seguida dizer que a enganaram e que o bebê morreria de fome. O berçário do Juizado era iluminado por lâmpadas roxas. De madrugada, Vlademir e Virgilinho se esgueiravam até a cozinha, abasteciam a mamadeira com leite da geladeira e alimentavam a irmãzinha. Com medo de que fossem dados a famílias diferentes, os meninos passaram a dormir no chão, ao lado de Isabel. Um se amarrava ao outro, e cada um prendia uma parte da roupa no berço. Se sentissem qualquer movimento, acordariam para lutar e impedir a separação. [526]

Magalhães, M. (2012). Marighella: O guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo, SP: Companhia das Letras.

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Crianças vítimas e testemunhas: material de apoio

O Escritório para vítimas de crime (Office for Victims of Crime), vinculado ao Departamento de Justiça dos EUA, disponibiliza material para ser utilizado nas diferentes etapas associadas a crianças e adolescentes vítimas e testemunhas no âmbito judicial.

“Para as crianças, participar do sistema judicial como vítima ou testemunha pode ser especialmente confuso, angustiante e até traumatizante. O Material de Apoio a Crianças Vítimas e Testemunhas foi criado para oferecer suporte a crianças e jovens durante seu envolvimento com o sistema de justiça como vítima ou testemunha de um crime”.

Child Victims and Witnesses Support Materials

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Depoimento Especial, Testemunho Judicial, Diretrizes Internacionais: Dissonâncias

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Resumo

O depoimento especial de crianças e adolescentes e a Lei 13.431/2017 questionam a interface entre a psicologia e a justiça. Essa lei tem em suas fontes a Resolução 20/2005, do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, que traça diretrizes para a justiça em casos de crianças vítimas ou testemunhas de crime. Realizou-se pesquisa qualitativa, baseada em levantamento bibliográfico e documental, tendo por eixo as legislações mencionadas e os procedimentos e papéis profissionais nelas previstos. Avalia-se a dissonância entre os dois documentos e suas consequências, bem como as definições de vitimização secundária, revitimização, pessoa de apoio e intermediário, não adotadas na Lei 13.431/2017. Algumas práticas estrangeiras alinhadas à Resolução 20/2005 são descritas e comentadas, mostrando diferenças significativas em relação ao que é realizado no Brasil. Conclui-se que uma dessas diferenças entre um e outro documento é o aspecto da proteção, que perde sua força e revela o limite do funcionamento do judiciário no acolhimento daquele que demanda cuidado.

Palavras-chave:
Depoimento especial; Abuso da criança; Testemunhos; Processos legais

Artigo:

https://www.scielo.br/j/pcp/a/3YmwnkLHX9vHQBjHF4nPJKS/?lang=pt#

La precariedad, lo común y el testimonio: el caso del calvario de Pedro

El artículo analiza la relación entre el testimonio, lo común y la precariedad a partir del estudio de caso de una mujer y el calvario que ella creó para su hijo, asesinado en Medellín. Se pregunta por lo que expresan las narrativas de hechos violentos y las maneras como ellas evidencian formas de elaboración del luto en el espacio público. El luto actúa sobre la comunidad, revistiéndose de una dimensión ontológica y otra política. La investigación se basa en una metodología cualitativa y tiene como estrategia la etnometodología. Las técnicas de investigación aplicadas fueron la observación directa, la revisión documental y la entrevista en profundidad. El agenciamiento de memoria coloca el daño causado por la violencia en la esfera de lo público y el luto se presenta como precariedad compartida y plausible de transformación, que permite a la memoria no solo reflejar el pasado, sino también apuntar para el porvenir.

Artigo

Qual o lugar do trauma no discurso jurídico?

Testemunho de Yehiel De-Nur no julgamento de Eichmann.

Felman em seu livro O insconsciente jurídico transcreve a parte final do testemunho de Yehiel De-Nur [ou Denoor, que assumiu o nome K-Zetnik] justo antes de seu colapso no julgamento de Eichmann, bem como as intervenções do promotor de justiça e do juiz presidente do processo. Neste link apresenta-se o vídeo da audiência e reproduze-se o comentário da autora.

Publicado originalmente em Cartas do Litoral

Testemunho de crianças: o apoio de cães treinados

Em maio de 2015 um cão treinado a serviço da polícia canadense ajudou criança vítima de abuso sexual durante seu testemunho judicial.

Foi a primeira experiência desse tipo no Canadá, embora essa prática já estivesse em uso nos EUA.

Segundo a matéria do jornal The Independent, Caber, labrador que atua na polícia da região de British Columbia, permaneceu junto à criança que reiteradamente interagiu com ele ao longo do testemunho.

Leia mais: http://bit.ly/2qyQwRs

Depoimento Especial: contexto e perspectivas

Roteiro da aula ‘Depoimento Especial: contexto e perspectivas’, que compõe o curso de extensão ‘Infância e juventude na atualidade:garantia de direitos e produção de subjetividade’, realizado na PUC-Rio em outubro/2018 – https://zenodo.org/record/1447128

 

Justiça em Casos envolvendo Crianças Vítimas e Testemunhas de Crimes. Lei modelo e comentário relacionado. Tradução

Tradução do documento do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc) Justice in matters involving child victims and witness of crime — Model law and related commentary. 

Trata-se de fonte importante para o estudo e discussão de temas associados ao depoimento judicial de crianças e adolescentes.

Justiça em Casos envolvendo Crianças Vítimas e Testemunhas de Crimes. Lei modelo e comentário relacionado

Sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência. DECRETO Nº 9.603, DE 10 DE DEZEMBRO DE 2018.

Regulamenta a Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência.

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